sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Lamentos






Toda noite penso em você. Não sei mais onde você está, o que está fazendo, quantos novas pessoas encontrou, com quem convive agora. Não sei mais tanta coisa sobre você.

Fica talvez a saudade de algo, saudade da pessoa, dos mundos transitados, dos momentos vividos, dos risos, e até mesmo das tristezas...

Falta até mesmo palavras pra escrever, ou descrever o que sinto no momento. Sentimento confuso de perda, mas ao mesmo tempo de conformação, sentimento de resignação, mas já aprendi a lidar com ele.

Saber que talvez tenha sido eu a causar tamanha distância muito me incomoda, muito me faz sentir estúpido por fazer com que você não esteja mais ao meu lado.

Tanta coisa mudou desde então que nem sei mais se ainda estaríamos no mesmo lugar, na mesma página, com a mesma afinidade de outrora.

Pena que aconteceu desta forma. Pena que não era para ser.

Lamento resignado como quem chora por algo que não pode mudar, como quem pede socorro sem ninguém para ouvir a voz que ecoa, como mero sino que soa no nada.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

O juiz, o general e o Outro.




Cada um enxerga o Deus que quer, mas não apenas o Deus que quer, mas o deus que lhe é ensinado. Alguns são ensinados que Deus é um grande juiz que tudo vê o tempo todo, que está sempre pronto a encontrar uma falha para nos punir e nos condenar ao inferno eterno, ou então nos recompensar por todo o bem que fizemos na Terra durante nossa pequena jornada por aqui.

Este deus que administra uma balança e pesa todo o bem e todo o mal e feito é bem recorrente nas várias falas que ouvimos por aí em diversas igrejas, discursos, etc. A meu ver esta visão coloca a questão da salvação de uma forma bem simples. Vira uma questão de meritocracia aplicada à alma. Se você fez o bem, será recompensado, se fez o mal sofrerá as punições. Tipicamente a teologia da retribuição/deuteronômica tão criticada já nos textos de Jó e Eclesiastes.

Esta mudança da forma de ver Deus acontece até mesmo no próprio texto bíblico. O "Senhor do exércitos" é a forma como o povo de Israel via o seu Deus. Tanto que se notarmos o texto bíblico no Antigo Testamento, veremos que as constantes guerras se davam entre os povos, mas entre os deuses dos povos também. O exemplo clássico de Elias contra os profetas de Baal  tipifica esta relação muito bem. A questão ali era saber quem era o deus mais poderoso; ou seja, o deus mais poderoso seria aquele que mandaria o fogo dos céus e queimaria as ofertas do altar. Dessa forma, o "senhor do exércitos" tinha sempre que dá mostras do seu senhorio a cada batalha, e não raro vemos deus sendo descrito como um general que daria as estratégias ao povo de Israel para que estes ganhassem a batalha.

Esta visão sobre Deus condiciona também o que pensamos que Ele possa querer de nós. Se notarmos bem, não há uma proposta de "evangelização" no Antigo Testamento. Os povos derrotados geralmente eram eliminados pois eram vistos como rebeldes e desobedientes. Não há uma tentativa de converter os povos derrotados, é como se o senhor do exércitos não tivesse interesse em novos guerreiros. Podemos notar que a imagem de Deus para o povo de Israel é a de um Deus que comanda seu povo, é um Deus general, que funciona como legitimador das guerras por território. Talvez no Antigo Testamento, apenas em alguns dos salmos de Davi podemos ver esta imagem se esvaindo e se tornando mais intimista.

É bastante óbvio que a imagem que temos de Deus é fundada a partir da cultura que vivemos. Seria até interessante pensar hoje a relação ou até mesmo a volta da doutrina da teologia da retribuição sob o nome de teologia da prosperidade à luz da presença massiva do capital em praticamente todos os setores da vida.

É como que se de alguma forma, a teologia da prosperidade não mais precisasse de Deus para fazer efeito, mas apenas do pressuposto que a meritocracia é um bom meio para as coisas se encaixarem.  Se antes a teologia da retribuição colocava tudo nas mãos de Deus, chegando várias vezes a negar a própria vontade do homem em nome da vontade de Deus, (doutrina próxima a defendida por Calvino) a teologia da prosperidade coloca Deus na mão do homem. De doador, Deus passa a ser visto como serviçal que há muito tempo atrás teria feito uma promessa de honrar o mérito do seu senhor. Esta perversão da noção de "servo" na relação para com Deus é algo bem comum hoje em dia, principalmente nos meios neo-pentecostais.

Estas diversas visões a respeito de Deus poderiam ser multiplicadas ad infinitum tanto no texto bíblico e daí mostrar suas evoluções, etc, quanto se considerássemos outras culturas, ou outras religiões, etc. Esta tarefa por mais interessante que seja é impossível de ser tratada neste pequeno texto.

Para mim, as duas formas que o texto bíblico expressa de forma mais "universal" a imagem de Deus é na fala do salmista que diz: "Oh Deus, tu és o meu Deus e eu  te busco intensamente" (Sl 63:1 - NVI) . Ou seja, Deus é sempre o meu Deus, pois sempre o vejo de forma diferente e nova, pois ele se revela para mim sempre de forma diferente e nova. Eu sempre me relaciono com ele a partir das minhas vivências, a partir daquilo que me ensinaram. O meu Deus só passa a ser "pai nosso" quando encontramos alguém que o vê parecido como nós o vemos. Quando somos inseridos em um cultura que nos diz que "deus é assim". Deus nunca é igual para mim e para o outro, mas é parecido. Deus é sempre uma experiência particular que toma sentido a partir do outro.

A segunda, e talvez a definição mais simples, é a de João que afirma que "Deus é amor", (I Jo 4:8) ou seja, Deus é sempre incompleto, pois o amor é sempre incompleto, sempre está pronto para se doar, para abrir concessões, para se expandir, o mesmo penso eu a respeito de Deus. Deus é este inominável que se mostra a partir do amor ao próximo, que se mostra no amor à terra, que se abre ao outro se doando sem nada esperar receber. Talvez por isso a definição mais simples seja a mais complicada no final das contas. Daí talvez que as diversas formas de enrijecer a imagem de Deus seja sempre uma espécie de atentado à liberdade do amor que se encontra em todos. 

Por isso que Deus é sempre meu Deus, mas ao mesmo tempo é sempre "Pai nosso" que é visto sempre em pequenos traços, mediado pelo meu contato com o próximo a quem sempre posso levar amor fazendo com que Deus se mostre para o outro de forma sempre nova. 

No final então, nem o juiz, nem o general,  mas apenas um grande outro que se revela sempre de forma nova dando sentido à existência.

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

O Atalaia






Nem sempre os ouvidos atentos encontram ouvidos atentos
Afinal, quem vigia o atalaia enquanto ele faz o seu trabalho?
Não existe o atalaia do atalaia, mas ele sempre está sozinho.
E talvez apenas por estar sozinho é que seja capaz de ser um atalaia.

O atalaia olha para todos os lados, exceto para dentro de sua fortaleza
E aí, bem dentro do seu lugar, se encontra o objeto que lhe causa angústia
Nada ele pode fazer pois nunca encontra com este objeto,
Já que seus olhos sempre estão fixos na cidade.

O atalaia cumpre seu papel de olhar para fora,
Mas sob a pena de nunca olhar para dentro
Nas vezes que o faz, raramente encontra alguém para ouvir seus gritos
Novamente está sozinho.

O atalaia sempre tipifica nós mesmos.
Estamos sempre de olho na cidade, sempre de olho nos perigos que vêm de fora,
Mas raramente olhamos para dentro da nossa fortaleza
De onde talvez virão os maiores perigos.

E quando o atalaia olha para dentro e quer erguer sua voz para alguém
Não raro encontra o nada como ouvido atento.
E novamente está sozinho.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Igrejas inclusivas - Algumas considerações






Todos que me conhecem sabem que sou super a favor da causa homossexual, defendo que eles devam ter todos os direitos iguais como  qualquer outro cidadão, quanto a isso acho que não tem o que discutir. 

Recentemente recebi um email sobre a criação de uma igreja gay que se reúne em BH e em outras cidades brasileiras.  As igrejas ditas inclusivas já e existem há algum tempo. Em um grupo que participo a questão sobre esta igreja apareceu e entre as conversas foram ponderadas algumas coisas. 

A igreja evangélica lida muito mal com a questão homossexual e isto é sabido por qualquer homossexual que tente frequentar uma igreja evangélica. Geralmente é dado a este homossexual duas alternativas: Ou ele "abre mão" de sua orientação sexual (como se isso fosse possível), ou então "mantém sua orientação sexual" contando que não pratique uma relação homossexual. Não sei qual das duas alternativas seria a pior para o sujeito, mas nenhuma das duas soa saudável. 

E por que a igreja evangélica age assim em relação aos homossexuais? Porque para a igreja evangélica os escritos de Paulo devem ser lidos de forma literal sem contextualização histórica, sem a ponderação de que talvez a visão paulina seja fruto de seu meio, de seus próprios pré-conceitos, fundados em um tipo de antropologia que fazia sentido na época, mas que precisa ser repensada hoje. 

Notem bem que não cito os textos de Levíticos pois isto levaria a discussão para um outro lugar que seria uma questão do tipo: "Quais são os critérios para obedecer alguns preceitos de Levíticos (por exemplo quando citam a questão homossexual), e não outros claramente proibidos por lá (tais como os alimentos proibidos, os filhos desobedientes que deveriam ser apedrejados, etc)?" Questões estas que podem até ser analisadas em outro texto posterior. 

A meu ver, enquanto se mantiver uma visão fundamentalista do texto bíblico não é possível um diálogo aberto sobre a questão homossexual dentro da igreja evangélica. Pois temos que admitir que as duas "alternativas" que são dadas aos homossexuais pelas igrejas evangélicas citadas acima não configuram alternativas sadias. Apenas uma visão fundamentalista do texto bíblico permite o tipo de tratamento que é dado aos homossexuais dentro das igrejas evangélicas. 

Do ponto de vista teológico penso que a questão fica bem complicada para legitimar a igreja gay. No entanto, eu acredito que seja possível uma igreja cristã que aceite a questão homossexual sem abir mão de sua teologia, mas abrindo mão de sua antropologia, e neste sentido já há uma boa tentativa de diálogo. Como exemplo cito o livro lançado pela Unisinos chamado "A pessoa sexual" onde este diálogo é feito de uma forma mais sistemática. 

Algo que me preocupa é que ao ser necessário uma "igreja gay" não estaria a própria igreja enquanto instituição sucumbindo à dinâmica mercadológica em um nível acima do que já vemos constantemente hoje? 

No final das contas parece que quem determina o "tipo de igreja" é a "demanda do mercado" de forma que ela se torna mais um produto a ser consumido. Ou seja, tem-se a igreja gay para os gays, a igreja rica para os ricos, etc. como sendo um mero produto, e isso a meu ver é um projeto fadado ao fracasso.

Por um lado estas igrejas podem ser "úteis" por permitir uma certa vivência congregacional a indivíduos aos quais são negados o congregar, mas por outro lado todas estas "mercadorias eclesiásticas" podem estar cooperando para o esvaziamento da proposta que diferencia "igreja" de "produto"...

Em suma, não seria a própria dinâmica do capital que criaria a "necessidade" de uma igreja gay de forma a atender "o mercado" carente de um certo produto da mesma forma que as igrejas que adotam a teologia da prosperidade vêm fazendo? E se for esta a relação predominante, não estaria a igreja gay sendo um grito de intolerância diante de uma instituição que se nega a aceitar seus pressupostos?

Entra-se numa dinâmica estranha onde ambos os lados podem ser chamados de intolerantes. Tanto a igreja cristã que nega a aceitar a questão gay em nome de uma certa teologia, e ao mesmo tempo a igreja gay que tenta forçar um reconhecimento em uma instituição que não aceita os pressupostos e para isso assume o título de "igreja cristã" sem uma certa legitimidade.  

Mas por que as igrejas que adotam a teologia da prosperidade  e todas estas falcatruas que vemos em seu meio são aceitas como igrejas evangélicas e as inclusivas não? A meu ver é porque as igrejas neopentecostais não mexem na "antropologia teológica comumente aceita", enquanto que as igrejas inclusivas precisam se arraigar seu discurso "refundando" uma antropologia.  

A questão é bem embricada e vários fatores estão relacionados, apenas citei alguns aqui para  vermos que a questão não passa apenas por uma questão teológica, embora tenha nela a base da minha crítica. 

Para mim, falta às igrejas ditas inclusivas um embasamento teológico mais consistente de forma a legitimar o seu discurso dito cristão. Enquanto isso não acontecer, penso que as igrejas inclusivas permanecerão sendo vistas com maus olhos pela igreja cristã e sua tentativa de inclusão terá pouquíssima chance de ser aceita. 

Fica aqui o meu convite às igrejas inclusivas