segunda-feira, 31 de agosto de 2009

em defesa de marta

A letra mata, mas o espírito vivifica

"Disse Jesus: Teu irmão ressucitará.
Respondeu Marta: Eu sei que ele ressuscitará na ressurreição, no último dia." Jo 11:23,24

"Respondeu-lhes Jesus: Marta, Marta, estás ansiosa e preocupada com muitas coisas, mas uma só é necessária. Maria escolheu a melhor parte e esta não lhe será tirada."
Lc 10:41

"O filho do homem será entregue nas mãos dos homens. Eles o matarão, e três dias depois ressurgirá. Eles, porém, não compreendiam esta palavra, e o receavam interroga-lo." Mc: 9:31,32

Queria falar um pouco sobre Marta. No episódio referente à morte de seu irmão ela tem um diálogo interessante com Jesus sobre a ressurreição.
Como sabemos, na época de Jesus, o conceito de ressurreição ainda não estava consolidado, tanto que os discípulos não entendiam quando ele falava que iria morrer e ressuscitar no terceiro dia. O significado dessas coisas lhes estava oculto. Eles não compreendiam. O que nos levaria a pensar que talvez o conceito de ressurreição seria conhecido por apenas uma parte mais intelectual da população, ou por quem tivesse algum tipo de estudo mais elaborado.
Essas conclusões sobre o conceito de ressurreição, e sua evolução desde o Antigo Testamento, pode ser consultado no maravilhoso livro do Robert Martin-Archad "Morte e Ressurreição no Antigo Testamento"
No entanto, Marta demonstra compreender o conceito de ressurreição. (Talvez ela teria um contato com a intelectualidade da época, ou coisa do tipo) Ela expõe pra Jesus esse conhecimento ao afirmar que sabe que seu irmão ressuscitará no último dia.
Algo interessante que acontece com Marta é que quando Jesus está em sua casa, ela se preocupa em servi-lo, i.e, fazer as honras da casa, enquanto Maria se preocupa em ouvir aquilo que sai da boca de Jesus. Jesus a adverte falando que ela está preocupada e ansiosa com muitas coisas que não eram necessárias.
Penso que várias vezes nós estamos preocupados com várias coisas que não são necessárias. Dominamos os conceitos sobre vida, morte, ressurreição, salvação, fé, mas ficamos como quem "apenas observa o vento" como diria o Eclesiastes. E para estes, o próprio Eclesiastes afirma que "nunca segarão" (Ec: 11:4).
Preocupamos-nos demais em saber definir as coisas e esquecemos de viver o "espírito da palavra". Não adianta conhecer a letra se não vamos viver a palavra.
Os discípulos tinham essa vantagem. Eles não conheciam a letra, mas viviam a palavra. (Não estou defendendo aqui a ignorância em relação aos conceitos, acho que eles são extremamente importantes, no entanto, penso que o mais importante é viver a palavra ao invés de dominar a letra).
Marta dominava a letra. Tinha fé de que o seu conceito era verdadeiro e ele se concluiria no dia da ressurreição dos mortos, e por isso que quando Jesus pede para removerem a pedra, ela é a primeira a dizer: "Mas Senhor, já cheira mal, já se passaram 4 dias". (Segundo Martin-Archad, haveria a crença de que a alma rondava o corpo do morto por três dias e que durante esse período, a alma do morto poderia "voltar").
(Talvez daí, a justificação de Jesus ter aparecido apenas no quarto dia. Vindo quando toda a esperança já teria ido embora, vindo quando a morte reinava, trazendo ressurreição e vida, i.e, trazendo a si mesmo por Lázaro, alusão ao que Ele fez na cruz. Trouxe a si mesmo por nós, trazendo a ressurreição e a vida.)
Jesus responde: Não te disse, que se creres verás a glória de Deus?"
Há uma desconstrução da ordem das coisas na fala de Jesus. A ressurreição não se dará apenas no último dia, mas onde Jesus está, pode haver ressurreição.
Daí sua fala anterior para Marta, "Eu sou a ressurreição e a vida".
As palavras de Jesus para Marta visam gerar em Marta a desconstrução das coisas. Marta fazia o que era certo. Ela cria no que era certo. Ela servia Jesus em sua casa como toda boa anfitriã deveria fazer. No entanto, faltava o conhecimento do que era o mais importante. Faltava compreender que a ordem das coisas é construída por nós, e às vezes ela deve ser quebrada para que o espírito suprima a letra, e possamos nos achegar e prestar atenção ao que realmente importa. O conceito que temos das coisas, a preocupação em agirmos de acordo com as etiquetas que aprendemos, tudo isso fica vazio diante da Palavra que dá vida.
Talvez a única coisa que possamos fazer é ouvir a Palavra que nos dirá o que quer que façamos para transformar o mundo em Reino de Deus. E a partir daí agiremos. Não mais como quem simplesmente detém a letra, não mais como quem "sabe o que tem que fazer", mas como alguém que compreendeu o sentido das coisas, como alguém que se vê impelido por essa Palavra a transformar o mundo.
Penso que só compreenderemos isso se andarmos com Jesus como seus discípulos fizeram, nos achegarmos a Ele como Maria fez, e só depois agirmos como Marta.
Mas agora uma Marta melhorada. Não aquela que apenas domina os conceitos e faz o que deve fazer, mas agimos como quem conheceu o sentido das coisas, assentou-se aos pés do mestre e detém o conhecimento dos conceitos.
Proponho que esta Marta melhorada seja um exemplo para nós.

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